Think Pong: Para que servem os números?

Um dos momentos mais importantes da semana aconteceu no seu último dia. Na madrugada de sábado para domingo milhares de estudantes do 12º ano esperavam ansiosamente ligados à internet ou aos telemóveis as noticias que mudariam a sua vida. Para o bem ou para o mal. Na grande maioria este ano para o bem.
Cerca de 85% dos candidatos ao ensino superior garantiram a sua entrada. E desses, cerca de metade na sua primeira opção. Foram resultados recorde. Sinais dos tempos. Toda a gente agora quer uma licenciatura, mesmo que não chegue a conclui-la, ou mesmo que a termine e saia directamente para um mercado de trabalho que não é o seu ou para o desemprego.
E é por isso que este ano "recorde" tem muito que se lhe diga. Antes de mais devemos ficar satisfeitos: as médias subiram em geral, houve um maior número de estudantes satisfeitos na hora do concurso e há essencialmente um número nunca antes visto de pessoas à procura de uma maior formação.

Mas temos o reverso da medalha. Estes resultados positivos devem-se a alguns pontos que suscitam algumas duvidas sobre os mesmos. Abriram 50 000 vagas novas para o ensino superior. Ou seja, é natural que mais gente tenha ficada colocada. As médias subiram muito por culpa de alguns exames, como é exemplo o de Matemática, que foram bastante facilitados.

Pessoalmente, valorizo entre estas duas faces aquela que é positiva. Mas sou um adepto do inconformismo e da constante evolução. Por isso devemos querer mais. E devemos saber criticar. Devemos exigir ainda melhores resultados e ter outras formas de avaliar e aconselhar os nossos alunos. Tanto ao 9º como ao 12º ano. Devemos pesar estes números de colocações com os da formação profissional, e das saídas para o mercado desses cursos. Estamos a entrar num ciclo vicioso de excesso de formados para os lugares disponíveis. Continuaremos a ter gente com excesso de formação para os lugares que acabarão por desempenhar nos seus empregos. Será que os interesses do país não deverão estar à frente da mentalidade "empresa" das universidades, que analisam os novos anos e abertura de novas vagas e cursos pela necessidade de propinas?
Há agora que preparar o novo ano, dar continuidade à evolução no ensino dos últimos 10 anos, e ir mais longe! Principalmente nos técnicos, nos profissionais, na aproximação das universidades aos mercados, e no correcto acompanhamento dos estudantes.

Nota: É interessante analisar a possível mudança de paradigma. Existem duas engenharias (Biomédica e Bioengenharia) com médias superiores a alguns cursos de medicina.

14 opinioes:

  • "Será que os interesses do país não deverão estar à frente da mentalidade "empresa" das universidades, que analisam os novos anos e abertura de novas vagas e cursos pela necessidade de propinas?"

    "na aproximação das universidades aos mercados"

    Pensei que a mentalidade de empresa faria com que os interesses do país (dar BOA formação às pessoas) fossem cumpridos. Porém, é por NÃO ter mentalidade de empresa e ter muita intervenção estatal que isto anda assim. Os reitores querem dinheiro, o governo que resultados. As universidades abrem cursos ao desbarato para terem o máximo de alunos possíveis. Se os resultados forem fracos, faz-se um "tunning" às estatísticas dos finalistas. As discrepâncias entre os dados das escolas e os do MCTES comprovam isso.

    Ter um licenciado no desemprego ou a cumprir uma tarefa que não seja a especialidade da sua área de formação comporta um enorme custo de oportunidade para o Estado.

    Analisemos o caso dos professores:
    a falta de flexibilidade no seu mercado de trabalho (remunerações generosas comparadas com as restantes profissões, garantia de emprego, progressões automáticas) fez com que essa profissão fosse muito concorrida mesmo quando se aproximava a passos largos do limite de empregabilidade. A enorme quantidade de cursos baratos que abriu pelo país todo entupiu o sistema. Foi o preço a pagar por não ter nenhuma "torneira" de controlo.

  • Então isto está assim porque o Estado se mete demasiado nas questões das universidades? No entanto afirmas que são os reitores que querem dinheiro, e as universidades que abrem cursos ao desbarato?

    Não queres então que o estado tenha mão nisto? Ah, pois. Achas que já tem demasiado.

    Olha "é o preço a pagar por não ter nenhuma "torneira" de controlo".

  • Os reitores representam todo o pessoal docente e discente que trabalha na sua universidade. De tal forma, a qualidade do ensino é apenas uma das prioridades, não é
    "A" prioridade. Porque é que haviam de dar ouvidos aos alunos se não são eles que lhes dão a maior receita? Basta enchouriça-los em salas de aulas para receber o dinheiro.

    Curiosamente, as melhores universidades do mundo são privadas. Vá-se lá saber porquê... Será porque têm de cativar os alunos? Náá... isso é muito à frente...

  • Questão ideologica meu caro Hugo e Paulo. Se calhar dava jeito que em Portugal existissem ideologias vincadas, tal como em Espanha...talvez fosse mais fácil esta discussão.

  • Anónimo:

    As ideologias vincadas são uma treta. Nenhuma ideologia é perfeita ou exequível em qualquer cenário. É preciso ter ideias consoante a conjuntura de um país/região. Dogmatismos não.

  • Se eu percebi o que o anónimo quis dizer, e achando que sei quem ele é, parece-me que o que ele queria dizer é que isto são questões ideológicas. E que cada pessoa deve defende-la afincadamente. Duvido vindo de quem (eu acho) que vem que fosse um apelo ao "casmurrismo".

  • Paulo, não vale a pena atirar-se areia para a vista de ninguém, nem fazer truques com as palavras: os exames da primeira fase desta ano foram estupidamente fáceis e a prova está aí, na incrível subida das notas dos últimos colocados! Na minha faculdade a subida foi de quase dois valores e não acredito que é por serem mais espertos do que os dos anos anteriores...

    Falarmos de resultados recordes e de querer ver a coisa "pelo lado positivo" é ceder à retórica do Governo, comprometendo toda a análise posterior.

    É minha opinião que falta ao nosso país gente com formação superior. É preciso incentivar e ajudar aqueles que pretendam essa formação, mesmo que depois, no mercado de trabalho, a formação que o trabalhador tem seja superior àquela que efectivamente necessita para o cargo que desempenha. Isto apesar de não o Estado dever dar todas as condições e fazer aquilo que estiver ao seu alcance para que essas pessoas (bem como aquelas que não têm formação superior) possam trabalhar num melhor emprego.

    Concordo contigo quando dizes que há cursos que não se justificam. O melhor exemplo que encontro é em Braga, quando há dois ou três anos abriu a licenciatura em Filosofia, estando já a universidade com problemas financeiros e havendo na mesma cidade aquele que é, possivelmente, o melhor curso de filosofia do país.

    Quanto a essa dos interesses do país estarem à frente da mentalidade empresa da universidade, não concordo. Acho que as universidades ainda não têm uma mentalidade empresa, e talvez seja um pouco isso o que lhes falta. Abrirem um curso só para receberem mais financiamento é o contrário da mentalidade empreendedora, é sobreviver à custa do financiamento estatal...

  • Tiago

    Apenas uma adenda: não é só formação superior que falta. Falta BOA formação em todas as áreas e níveis de ensino, sendo o ensino técnico um dos mais gritantes.

  • Está adendado.

  • Tiago,
    Antes de mais, os números estão lá. Por isso não se compromete análise alguma considerando os resultados recorde.

    Concordo contigo quando dizes que há um défice de pessoas formadas em Portugal. Mas em algumas áreas são muito mais necessárias do que outras. Por isso é aqui que o estado tem que desempenhar o seu papel regulador. Acordar com as universidades o encerramento de alguns cursos, a redução das vagas de outras, e o aumento naqueles em que realmente precisamos. Para todos os outros teria que existir uma grande aposta em técnico e em profissional. Não podemos é achar que devemos continuar a formar mesmo que depois tenham "excesso de formação" para os cargos a desempenhar. É um gasto excessivo do estado e da pessoa, para depois nunca ser remunerado pelo mesmo...

  • Paulo, não acredito em excesso de formação.

    No teu raciocínio encontro um problema muito grande: a liberdade de cada um ir para o curso que pretende fica gravemente afectada, dado diminuírem o número de certos cursos, o que fará subir as suas médias.

    Ensino técnico e profissional já o há, embora reconheço que têm de ser muito melhorados.

    Pessoalmente, penso que todo o sistema de ensino superior em Portugal está mal organizado: excesso de instituições públicas, excesso de cursos e fraca qualidade em muitos deles. Mas isso é fugir ao tema do post.

  • Tiago,

    - O excesso de formação pessoal não creio que exista também. Apoio incondicionalmente a vontade de cada um se valorizar. Mas de preferência que leve a resultados práticos, no que a formação académica diz respeito.(Qualquer outro tipo de formação pessoal servirá para o enriquecimento de cada um).

    - O meu raciocínio teria a o problema da "liberdade de cada um ir para o curso que pretende" ficar "gravemente afectada" se eu não acompanhasse essa redução do número de vagas com outros critérios na hora da admissão ao Ensino Superior, que não apenas a avaliação contínua e os exames. A vontade e/ou vocação (termo que me faz certa confusão) de cada um teria um papel fundamental.

    Mas parece-me aqui - e permitindo-me o abuso - e no outro lado do Think Pong (colinasagrada.blogspot.com), entre todos haver pelo menos um ponto de consenso: o ensino técnico e o profissional necessitam de medidas urgentes de reestruturação e de promoção.

    É preciso ir mais longe com a reforma do ensino.

  • Confesso que, por preguiça, não acompanhei a discussão do outro lado do Think Pong. Também eu disse que precisa de ser melhorado. Como estão, ou melhor, como estavam na altura em que eu saí do secundário (fez em Junho três anos, não representam qualquer mais-valia face a outros cursos, em matéria de saídas profissionais, pois não há reconhecimento por parte das entidades empregadoras dos conhecimentos adquiridos na área específica de formação. Se calhar, esses conhecimentos também não foram devidamente transmitidos... Não sei...

    Não imagino como seria possível medir a vocação para determinado curso.

    O método para entrada no ensino superior que mais me agrada é através da selecção por exames específicos feitos pelas instituições de ensino superior nas quais o estudante pretende ingressar.

  • Com testes psicotécnicos que já se vão fazendo. Com entrevistas como sugeria o Hugo. E porque não com os tais exames especificos feitos pelas faculdades. Embora com este última possa surgir de novo a questão do exame nacional. A entrada ou não em determinado curso vai depender daquele dia àquela hora. Mas a vida é feita destas coisas.

    Serve isto para concluir: Estou longe de ter a minha opinião formada sobre o melhor método, mas está na hora de se estudar qual será.