Todos os dias falamos no que mudou no mundo com muita admiração. Há 10 anos, uma disquete de 1 ‘mega’ transportava a informação necessária para um trabalho, um jogo, etc. Hoje compramos discos com 1000 ‘gigas’ – os impensáveis ‘teras’ – e enchemos com tudo o que a geração da internet nos disponibiliza gratuitamente. Mas o mundo mudou em outras coisas que não nos apercebemos tantas vezes.
Há 50 anos atrás, não era eu nascido obviamente, e portanto falo por histórias e recordações alheias, Os adultos da altura trabalhavam sem complexos na agricultura, e nas confecções. Ainda há quem o faça claro está. Mas a classe de onde vem a grande classe média-baixa actual vivia de trabalhos deste género. Tinham empregos de poucos escudos por mês, e a viagem da vida deles era para Lisboa, ou ao Algarve. Passávamos para alem da fronteira uns metros e tínhamos ido ao estrangeiro. Dividia-se o pão que havia na mesa, e remediava-se com uma malga de caldo. Vivia-se alegremente, ou é apenas a nostalgia de quem me conta.
20 anos depois, ou se quisermos, há 20 anos, no meio caminho entre esse passado, e o nosso futuro, Portugal teve dinheiro. As pessoas dessa classe subiram às vezes sem o perceberem na vida. As condições gerais de vida melhoraram abruptamente. A viagem da vida começou a ter aviões à mistura. Ea comida na mesa tornou-se abundante. Era tempo de mostrar riqueza e bem estar através da barriga grande. Engordamos as mesas e as carteiras e mostramos a toda a gente que o fizemos. Foi tempo de jóias generalizadas e de lançamento de marcas para estas classes, que vestiam agora moda. Perdeu-se a alegria nostálgica de quem o conta?
Nos “tempos de hoje”, regredimos. O Pais e os seus cidadãos contam trocos. Trabalham-se já turnos duplos para aguentar um estilo de vida que se acaba sempre por abandonar. Já ninguém tem vergonha de novo da calça manchada de lixívia, do carro sujo, e de anunciar que a quem tenha que ouvir que não há dinheiro para festas e festins. Perdemos a barriga cheia e a vergonha de não a ter.
Felizmente o mundo adaptou-se a nós, e os luxos que se tornaram essenciais estão agora a preços da chuva de novo. Telemóveis, portáteis, viagens low cost e outros “adereços” com que decoramos a vida. Estamos aptos a contar estes dias aos netos com as saudades de quem me conta a vida de há 50 anos.
Sem rigor histórico ou cientifico, assim vejo a mudança do mundo em que eu não vivi naquele em que me vejo a crescer.